terça-feira, 18 de agosto de 2009

Livros que nunca sairão - Parte 2

Leite Derramado, de Kid Bengala

Um homem muito velho está num leito de hospital. Membro de uma tradicional família brasileira, ele desfia, num monólogo dirigido à filha, às enfermeiras e a quem quiser ouvir, a história das sacanagens de sua família desde os bailes de carnaval, passando por uma dama da alta sociedade, uma senadora, até o tataraneto, garotão do Rio de Janeiro atual, que já segue a tradição. Uma saga familiar caracterizada pela decadência social e econômica, tendo como pano de fundo a história do Brasil dos últimos 30 centímetros.

domingo, 9 de agosto de 2009

Livros que nunca sairão - Parte 1

Eu, Chapeuzinho V., 13 anos, drogada e prostituida

Numa floresta encantada que buscava entender qual o sentido de nação, a pobre chapeuzinho se envolve com Detlefwolf, o perigoso traficante de balinhas. Esse envolvimento a leva a um submundo até então desconhecido na floresta, onde seu vício precisa ser sutentado com a prostituição, e ela passa a rodar a cestinha. Para piorar, o agente de polícia antidrogas conhecido como "Der Jäger" (O Caçador) vai cruzar seu caminho enquanto procura a trilha da maior traficante da floresta, conhecida como Wenig Großmutter, a vovozinha. Numa disputa de poder, Detlefwolf mata Wenig Großmutter e assume seu lugar, o que se revela no final um perigoso passo em falso, que vai colocar Chapeuzinho V. de frente com Der Jäger. 135 páginas R$ 32,90 Editora F.D.P.

sábado, 1 de agosto de 2009

Duas Janelas (clássicos Diego Paiva)

Eu estava procurando um esboço de livro nos meus emails antigos, mas não encontrei. Deve estar em algum HD jogado no meu quarto, depois preciso ver isso. Queria retomar o livro, surgiram idéias novas para um texto que já parecia perdido, mas também não dá para recomeçar do zero.

Mas enfim, nessa procura achei um texto de 22/fev/2005, uma época onde eu ainda fingia que fazia faculdade, ainda não tinha começado como roadie, ainda não tinha passado pela fase 'o amor não existe' e o Ronaldinho Gaúcho ainda era a esperança do hexa. Eu ainda via o Yama duas vezes por semana, isso realmente faz tempo. A Jéssica era menor de idade e nem me conhecia. Tempo, tempo, tempo, tempo, és um dos deuses mais lindos. Mas aqui está o texto, que achei num arquivo sem título, e que mais de 4 anos depois de nascido ganha nome: "Duas Janelas", revisado e remixado.

Estava no ônibus. Já estava cansado, sonolento, transformando o balanço que o coletivo proporciona em um embalo de babá. O ônibus passava em uma das pequenas ruas do subúrbio do Rio de Janeiro, em alguma via de mão dupla. Pelo outro lado, vinha mais um ônibus, e ambos pararam nos ponto de cada lado da via, travando todo trânsito durante o embarque e o desembarque de passageiros. O rapaz que estava sentado em um deles olhou para o lado e a viu. Ela também viu o rapaz. Depois de alguns meses, enfim se encontravam novamente, logo numa situação tão inusitada. Dois ônibus em caminhos opostos, como que representando o destino que cada um tomou. Seria só aquilo. Um simples olhar um ao outro, uma simples lembrança viva. “Ei, tem como trocar cinqüenta?”. Era um trocador falando com outro. Diante da resposta afirmativa, ele foi até outro ônibus para tocar o dinheiro de um passageiro desprevenido.

Ele percebeu... era o destino, fazendo com que eles se observassem mais um pouco. Ela tinha cortado o cabelo.. dois dedos. Ele com essa mania de reparar tudo. E já havia passado o susto de estarem se encontrando ali, um quase de frente para o outro, separados por duas janelas abertas. Do lado dele, uma senhora com seus cabelos brancos e sacolas. Do lado dela, um outro rapaz, ouvindo um walkman e balançando a cabeça.

Ele quase podia sentir seu perfume, aquele perfume que ele adorava, que ele sentia quando se beijavam, e, depois do beijo ela abraçava seu pescoço com as duas mãos e descansava a cabeça em seu peito. E agora ela ali, meio que com vergonha.. afinal, pouco tempo havia se passado depois de tudo, um tempo que ainda não conseguira cicatrizar todas as feridas. Ela olhou profundamente para o rapaz e sentiu medo: naqueles olhos ainda estava nítido o olhar apaixonado que ela conheceu.

Ele falou: “Estou com saudades”. As buzinas por causa do trânsito parado não permitiam que o som chegasse aos ouvidos dela, mas os movimentos da boca faziam com que a mensagem fosse claramente entendida. “Eu estou com muita saudade”, e não era nem preciso que ele abrisse os lábios para que ela percebesse isso.

Ela estava um pouco mais magra, essa blusa era nova, aquele colar também. Ela aos poucos foi perdendo a vergonha, mas não conseguia falar nada. “Eu ainda te amo”, foi mais uma vez o que o movimento dos lábios dele falava. Ela olhou fundo nos olhos dele. Ele estava o mesmo: Mesmo corte, mesmo boné, a mesma maldita camisa surrada que ele tanto adorava. Por que brigaram? Ah, sim, por bobagens, mas por muitas bobagens acumuladas. Depois de um certo tempo a relação se foi, mas dentro dos olhos dele estava claramente escrito que o amor ainda não.

Ela se lembrou dos momentos em que descansava a cabeça no peito dele e fazia as perguntas mais tolas do mundo. “Vamos ficar juntos para sempre?”, perguntava ela. “Para sempre me parece pouco tempo?”, respondia sempre ele. Agora ele havia percebido que estava certo. “Para sempre foi muito pouco mesmo”, mexeram seus lábios no meio das buzinas de trânsito.

A velha agora já demonstrava interesse naqueles olhares, e o rapaz ao lado da moça ainda continuava de olhos fechados ouvindo seu walkman. O trocador pegou as notas contadas e começou a retornar para o seu ônibus. Ele viu que só havia uma coisa a fazer. “Eu vou até aí”, disse ele com o seu movimento labial. Colocou as mão na barra do banco da frente e fez menção de se levantar. Ela se assustou. Seu olhar claramente demonstrava um “não sei”, e o rapaz já tinha aprendido o bastante para saber que em questão de tempo um “não sei” se transforma em um “claro que sim”. Chegou a hora de retirar todos aqueles meses perdidos. Oito, dez meses? Ele não sabia.

O trocador já tinha entrado no seu ônibus. Ele precisava agir rápido. Se levantou num pulo, tão rápido que ela ficou com medo da aproximação dele e se afastou, encostando no rapaz de walkman do seu lado. O rapaz abriu os olhos, retirou o walkman da orelha e passou a mão por cima do ombro dela.

“O que foi, meu amor?”. As palavras dele também eram nítidas mesmo sem o som, e a tensão dela em dizer "nada" também era nítida, assim como o olhar dela, desesperado, alternando entre o rapaz ao lado dela e aquele ônibus do outro lado, ele desconfiou e também olhou para o outro ônibus, mas não achou nada de mais. Ao ver que ela estava acompanhada, ele já tinha sentado e disfarçado. Ela permaneceu calada e manteve o olhar no outro ônibus. O rapaz do walkman também olhou e não viu nada de mais: apenas um rapaz com mais o menos o menos a mesma idade que a sua olhando para a frente, cabisbaixo, ao lado de uma senhora idosa.

Fazendo valer a metáfora, os ônibus partiram, cada qual para um caminho oposto ao outro.